quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Diana


   Continuando minhas reminiscências vou abrir um parentese pra falar de uma   amiga da infância. Na zona rural as amigas geralmente são as irmãs(quando são). Essa é praticamente a única amiga que eu tinha. Tinhamos a mesma idade. Brincavamos juntas. Ela era a filha caçula. Fora adotada por que sua mãe teve somente cinco filhos homens (Deus sabe o que faz).Suspeitavam que seu padrasto era também seu pai e ela filha de uma relação extraconjugal. Na infância fora por ele abusada sexualmente. Na adolescência ele a estuprou. Ela fugiu de casa. Fugiu para o garimpo. Desde então perdemos o contato. Lá casou-se e teve quatro filhos. Um dia, cansada das surras que levava do marido abandonou-o e voltou para os 'seus'. Aqui, entre os 'seus' passou a viver com um moço trabalhador e gentil que se dispôs a ajuda-la a criar as crianças. Na última vez que conversamos ela me disse que ia deixa-lo. Pra ela era fácil fazer sexo uma vez, quando era possível. Mas sempre, somente bêbada ou drogada. Diziam: 'quem nasce torto, não tem jeito mesmo', 'esse é um problema de sangue, se ela fosse do nosso sangue seria diferente'. Depois soube que ela estava internada numa clínica para tratamento de dependentes químicos. Sua mãe orgulhava-se de ter tido sucesso em seu casamento, apesar das dificuldades, enquanto muitas por aí nem conseguem se casar. Essas são estranhas lembranças doridas que me acompanham sempre.


Vaso de porcelana



Certo dia, num mosteiro zen-budista, com a morte do guardião foi preciso encontrar um substituto. O grande Mestre convocou então todos os discípulos para determinar quem seria o novo sentinela. O Mestre, com muita tranqüilidade, falou:

- “Assumirá o posto o primeiro monge que resolver o problema que vou apresentar.”

Então, ele colocou uma mesinha magnífica no centro da enorme sala em que estavam reunidos e, em cima dela, pôs um vaso de porcelana muito raro, com uma rosa amarela de extraordinária beleza a enfeitá-lo e disse apenas:

- “Aqui está o problema!” Todos ficaram olhando a cena. O vaso belíssimo, de valor inestimável, com a maravilhosa flor ao centro. O que representaria? O que fazer? Qual o enigma?



Nesse instante, um dos discípulos sacou a espada, olhou o Mestre, os companheiros, dirigiu-se ao centro da sala e … ZAPT … destruiu tudo, com um só golpe. Tão logo o discípulo retornou ao seu lugar, o Mestre disse:

- “Você será o novo Guardião do Castelo.”

Moral da História: Não importa qual o problema. Nem que seja algo lindíssimo. Se for um problema, precisa ser eliminado. Um problema é um problema. Mesmo que se trate de uma mulher sensacional, um homem maravilhoso ou um grande amor que se acabou. Por mais lindo que seja ou, tenha sido, se não existir mais sentido para ele em sua vida, tem que ser suprimido.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010


Antes de continuar escrevendo memórias vou trazer, pra espantar mau-olhado e inveja  e fazer uma limpeza no ambiente:




UM PÉ DE ARRUDA

FIGAS




SAL GROSSO





CARRANCAS




A MUITOS CRISTAIS







quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

A chegada


Eu estava dormindo e acordei quando alguém me cutucou dizendo: Acorda! Chegamos no Acre. A primeira lembrança é que estavamos parados no posto de fiscalização, por muitos conhecido como 'corrente'. Naquela época, em frente ao posto, existia um matadouro  e era rodeado por muitos urubus. Ficamos pouco tempo ali e seguimos para Senador Guiomard onde paramos para algumas compras. Naquele tempo a rua principal não era asfaltada e não tinha calçada. O mato que crescia na beira da rua, dava a impressão  de que a ela era um caminho próprio da zona rural e não da área urbana. Logo estavamos rodeados de garotos que carregavam caixas de isopor com refresco e bacias de quibes para vender. Pelos comentários, não era muito comum o que viam. Diziam: que é isso?? Uma casa andando?? Depois dessa parada seguimos para nosso destino final: a colônia Bom Jesus, à cinco quilômetros de distância na BR 317. Ela foi uma das colônias dos japoneses,  vendida para um acreano descendente de cearenses de quem a compramos.
O caminhão estacionou debaixo de um pé de mangueira em frente a casa de pernas muito altas. As pernas da casa eram tão altas que boa parte da mudança ficou embaixo da casa. Lá dormimos a primeira noite. Lembro bem da lua clara como eu nunca tinha visto antes. O mato alto em redor da casa assustava um pouco. Antes de sairmos do Paraná ouviamos muitas estórias de que no Acre haviam índios e animais ferozes.
Ficamos morando assim por muito tempo, encima eram os quartos e embaixo cozinha e sala. Até que meu pai construiu a nova casa, ele é carpinteiro. Negociou na serraria toras de madeira em troca de tábuas serradas.
Passamos alguns apertos, que foram diminuindo com o tempo. Quando meu pai veio comprar a colônia (em outubro), deixou plantada uma roça de arroz . Ele voltou pra buscar a gente e a mudança e deixou a plantação por conta. Quando chegamos os animais e pássaros tinham comido tudo. Tinhamos trazido milho e feijão. Era nossa refeição básica. Uma de minhas tarefas era moer o milho numa pequena máquina manual. Mas logo aprendemos a comer jáca, manga e goiaba que tinha  em abundância na colônia. Banana, mamão e castanha também não faltava. Depois descobrimos pés de ingá, graviola, cupuaçu e araçá. Assim fomos nos adaptando. Amoras e pêssegos, como aqueles que  tinham feito goiaba  e manga no sítio lá no Paraná, nem sonhar. Hummm(saudades!!). A criação de galinhas,porcos e a vaca pro leite ainda não era uma realidade. Comiamos então cutias, pacas e nambus, geralmente caçados no entardecer. O porco do mato era resultado das caçadas de domingo. Traíras e carás eram  frutos das pescarias nos açudes dos vizinhos. Além disso comiamos muito mocotó e bucho  de boi que eram doados num matadouro das redondezas.
E chovia, nossa como chovia!!! Que terra pra chover é o Acre. Madeira seca pro fogão de lenha era sempre um problema, até que nos acostumamos a armazenar com antecedência.
E assim fomos aprendendo a chamar pernilongo de carapanã, porrrta de porta dentre outras coisas que nem lembro mais.  
     

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

A viagem


Foram dez dias de viagem. Logo, antes do anoitecer, chegamos à balsa para atravessar o rio Paraná. Um rio tão largo como eu nunca havia visto um. Bem no meio do rio não dava pra ver nenhuma de suas margens. Uma imensidão de água. 
O motorista do caminhão dirigia até de madrugada quando o sono apertava. Então estacionava, geralmente próximo a um posto de gasolina e dormia um pouco. Antes do dia nascer ele retomava a estrada.Na carroceria do caminhão sobre uma pilha de colchões dormiamos, eu meus seis irmãos, meu pai, minha mãe e o irmão da esposa do meu tio. Meu tio, a esposa e o filhinho viajavam na boleia do caminhão.  Ao redor da pilha de colchões estavam armários e guarda roupas, dentre outros móveis sob uma estrutura de madeira coberta por uma lona. A lona  permanecia um pouco levantada e apreciavamos a paisagem que corria na beira da estrada. Quando paravamos para dormir ou iamos passar por algum posto de fiscalização a lona era totalmente abaixada. Ficavamos em silêncio para não sermos descobertos. Era proibido viajar daquela maneira.
A comida era feita  em um fogareiro de duas bocas. Geralmente o motorista que conhecia bem a estrada parava na beira de algum igarapé ou rio. Enquanto minha mãe cozinhava, lavavamos roupas, vasilhas e tomavamos banho. Logo, logo estavamos feito  camarões por causa do sol. Meu pai comprou um saco de bombons de hortelã. Ajudava a diminuir náuseas e vômitos. Depois de algum tempo a sensação de trepidação do motor  entranhava em nossos sentidos que já não sabiamos mais quando ele estava desligado.
Naquela época, até Cuiabá a estrada era asfaltada. De lá pra cá era lama, atoleiros e muito buraco, quando não era poeira.
O caminhão não atolou nenhuma vez. Lembro que por um longo trecho arrastamos um ônibus, que por ser muito baixo não conseguia andar sem atolar.
Nas proximidades de Cacoal existia uma fila de caminhões que aguardavam enquanto um trator os rebocava na travessia de um lamaçal que era impossivel de ser atravessado sem sua ajuda. Descemos e caminhamos alguns quilômetros até a parte urbana da cidade enquanto esperavamos a fila andar. Minha mãe aproveitou pra procurar notícias de alguns de seus primos que moravam naquela cidade.
Finalmente, na tarde do dia dezesseis chegamos ao nosso destino.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Seis de Janeiro


Esta é para mim uma data especial.É o dia dos Santos Reis que aos pés de Jesus deixam seus tesouros.Um dia de festa pra ser sempre lembrado pela cristandade. Na minha história pessoal essa data é também um marco do inicio de uma viagem, assim como os três Reis Magos, em busca do destino. Em 1978, na tarde de 6 de janeiro, encima de um caminhão, numa despedida cheia de lágrimas, deixamos (eu, meus pais e meus irmãos) a vila de nome São Pedro (distrito de Toledo), no Estado em que nasci(Paraná) para atravessar aproximadamente 5.000 km de estrada e chegar nesta terra onde hoje é meu lar. Porque viemos? O que viemos fazer? Como foi a viagem? O que encontramos quando aqui chegamos? Essas e outras histórias irei contando aos poucos.